' Agora que fizeste uma clicadela, apoveita e dá uma espreitadela ; ) #




sexta-feira, 26 de março de 2010

   Da Obra Satírica: Os Cartoons na Primeira República
  
Este trabalho insere-se nas Comemorações do Centenário da 1ª República, realizado em Área de Projecto de 12º Ano. O estudo deste tema enquadra-se no programa de 11º ano de História A – As transformações do regime político na viragem do século: os problemas da sociedade portuguesa e a contestação da monarquia; a solução republicana e parlamentar - a I República.
Por sugestão da professora Paula Sobral Gomes, criámos um grupo para trabalhar este tema, constituído por Ana Lopes, Ana Oliveira, Flávia Oliveira, Mónica Simões, Patrícia Gomes e Sara Martins, alunas do 12º ano da turma H da Escola Secundária de Alberto Sampaio em Braga, inscritas no curso Científico - Humanístico de Línguas e Humanidades.
      Após alguma pesquisa inicial, verificou-se que nesta época a produção de caricaturas e os cartoons era muito rica, tornando-se uma fonte histórica muito importante. A sua natureza icónica suscitou o nosso interesse no desenho e desenvolvimento do projecto. Ainda da mesma turma, temos uma outra colega, Susana Gonçalves, que irá tratar o seguinte tema: - A fotografia na1ª República. Assim, neste blogue irão ser também inseridas fotografias e outros materiais que retratam os problemas sociais da época, objectivo deste último trabalho.
      Com o auxílio da Professora Doutora Maria do Céu de Melo, professora da Universidade do Minho, nasceram as questões iniciais do projecto:
- Qual foi o papel histórico das fontes iconográficas (cartoons) na crítica ao período republicano?
- Qual foi o impacto da leitura e interpretação dos cartoons na nossa compreensão do quadro histórico do período republicano?
A primeira tarefa do grupo consistiu na pesquisa de caricaturas e notícias sobre alguns acontecimentos importantes do período republicano em jornais da época: “O Mundo” e o “Comércio do Minho” existentes no Arquivo Distrital de Braga. O objectivo foi manusear fontes primárias e perceber a sua importância na construção do conhecimento histórico. Seguindo o conselho do Director da Biblioteca, Dr. º Henrique Barreto Nunes, pesquisou-se alguns livros sobre caricatura que nos mostrasse o papel satírico das caricaturas e cartoons ao longo do tempo.
Numa segunda fase, seleccionámos alguns cartoons que focavam os seguintes domínios históricos: o social, religioso, económico e o político. Após esta escolha recolhemos informação histórica que fornecesse pistas para a contextualização e explicação da narrativa visual que estas fontes apresentam.
Numa terceira fase, trabalhar-se-á a leitura e interpretação de alguns cartoons, que adoptará a seguinte metodologia:
a) O grupo irá mostrar os cartoons aos colegas da turma que de seguida, responderão às seguintes tarefas:
- Que perguntas gostarias de fazer para melhor compreender esta caricatura?
- Com base na leitura dos cartoons e no conhecimento histórico adquirido sobre este período histórico, escreve um pequeno texto.
Tentaremos fazer uma pequena análise com ajuda da professora das questões e dos textos produzidos pelos colegas. Finalmente, faremos uma exposição aberta à Comunidade Escolar com alguns dos cartoons escolhidos, que serão ampliados e acompanhados de memórias descritivas.
No decurso desta actividade, organizámos uma palestra subordinada ao tema: “Da Obra Satírica: Os Cartoons na aprendizagem da História”, proferida pela Professora Doutora Maria do Céu Melo, docente da Universidade do Minho, e cujo cartaz será publicado. Esta palestra mostrou-nos como fazer o questionamento histórico destas fontes e as estratégias visuais que os artistas utilizam para exprimir as suas opiniões sobre um determinado contexto histórico.
     À medida que este projecto foi sendo desenvolvido, pensámos em construir um blogue para a sua divulgação. Estamos a sentir alguma dificuldade em ter o blogue todo pronto no prazo definido no regulamento, pois a nossa ideia é ir lançando mais informações à medida que o projecto se for desenvolvendo. Assim, este nosso trabalho enquadra-se na categoria 4 – Alunos do Ensino Secundário
Resumindo, os nossos objectivos são:
- Compreender o cartoon como fonte histórica primária, reconhecendo as estratégias visuais que os seus criadores utilizam para comunicar os seus pontos de vista;
- Interpretar as suas ideias, identificar a sua intencionalidade, e contexto histórico que as determinou e que elas apresentam;
- Estabelecer comparações entre as vivências do passado e as da actualidade, reflectindo nas mudanças que se operaram e o que se manteve na sociedade portuguesa.
- Avaliar a importância deste tipo de fontes na aprendizagem da História;
     Por fim, procurámos que a apreciação estética esteja também presente, dando a conhecer o papel destas imagens artísticas humorísticas na construção da representação de uma época em que a crítica social e política foi um sinal da revolta após muitos séculos de submissão. Elas são também o grito do povo pela liberdade que a República iria trazer.
     Assumimos este projecto como um desafio, na medida em que procurámos construir um percurso mais consistente na utilização dos cartoons como um tipo de fontes de real valor no entendimento de épocas históricas vividas.


     Aplicação Prática dos cartoons aos alunos
     Conforme referido no texto acima, pusemos em prática uma pequena experiência de leitura icónica de alguns cartoons em algumas turmas de Humanidades - 12º ano. O nosso intuito seria o de  perceber qual  o grau de dificuldade em analisar e interpretar os cartoons relativos à Primeira República. 
      A experiência consistiu em entregar um cartoon referente a cada dominio (social, politico, económico, etc) por aluno, de uma forma aleatória e duas questões que consistiam em:

 - Que perguntas gostarias de fazer para melhor compreender esta caricatura?
- Com base na leitura dos cartoons e no conhecimento histórico adquirido sobre este período histórico, escreve um pequeno texto.

     Chegamos à conclusão que é necessário um conhecimento histórico aprofundado para analisar e interprertar cartoons. Com esta esperiência percebemos que grande parte dos alunos não possuem qualquer tipo de estratégias, métodos de análise e principalmente conhecimento sobre a época para poderem decifrar as imagens. 
       Por fim, revelamos algumas das questões feitas pelos alunos aos cartoons:

  


  - Quem está a representar o Diabo?
  - Qual a importância do documento que o homem de vermelho tem na mão?
  - Quais as relações entre a Igreja e o Estado? 


Texto: " No cartoon podemos observar Afonso Costa, na personagem de Diabo, que levou a cabo as primeiras medidas de laicização e que queima na fogueira, qual Inquisição, a Igreja. Esta fogueira é alimentada pelos sacos de dinheiro do clero".







- Só as mulheres aderiram à moda?
- O que contribuiu para esta grande mudança da mulher?

Texto: "Estas caricaturas retratam a emancipação feminina. Uma altura em que as mulheres deixaram de estar restringidas aos seus lares aos seus lares, dedicando-se ao ócio.

 Assumiram-se, de igual modo, uma figura mais sensual, cortando os cabelos à “la garçonette” e adoptando roupas mais justas e subidas. A partir daqui , a mulher deixou de aparentar ser inferior ao homem."






- Qual era o papel da imprensa naquela altura?

- Porque está o Gullivier amarrado?

TEXTO: "Este cartoon representa o papel da Imprensa que tinha um papel bastante importante.

Em 1903, a Paródia prevê que a Imprensa extermine os inimigos ao acordar. O Gulliver amarrado representa a repressão, a falta de liberdade de expressão "

 
 

 
- Porque é que o Parlamento só é constituído por mulheres?

- O voto livre das mulheres será mesmo “livre ?”

Texto: (Imagem 1) No cartoon, podemos verificar a emancipação da mulher, a sua mudança tanto a nível psicológico como politico. Têm uma maneira mais vaidosa e até provocadora de se vestirem. Podemos também realçar a submissão masculina perante a mulher.
(Imagem 2) Nesta imagem podemos ver retratado um parlamento onde os governantes são figuras femininas. Este está associado ao direito de voto que as mulheres obtiveram.
      Em suma, este cartoon está ligado às mudanças da sociedade em relação à integração feminina.





- Qual a simbologia do banco?
-Para que nos remete o facto de se encontrar na figura um judeu?
-Qual a razão que leva o judeu a querer esmagar o banco?
-O porquê da sua Grande Mão?

Texto: "O Banco de Portugal encontrava-se em crise. Crise essa que levava ao despedimento daqueles que desempenhavam funções neste. Assim na figura o Judeu (homens que normalmente neste época desempenhavam profissões como banqueiros). Este mostra a sua ânsia em estragar o banco (simbolicamente referindo o banco de Portugal) como forma de exprimir a sua revolta face a esta situação.

       Resumindo, Portugal não se encontrava economicamente nas melhores condições que provocava descontentamento social."




 - Estão realmente feitas as pazes depois dos meses de desentendimento?

- Que razões levaram à mudança de atitude

Texto: "Neste cartoon está presente uma cronologia que vai de Maio a Julho.

    Em Maio, vemos o politico contra o Zé Povinho; em Julho a situação revira-se, e é o Zé Povinho contra o político; e finalmente, a relação acalma e os dois ” abraçam-se “. De acordo com os meus conhecimentos históricos, várias revoltas e contraposições eclodiram entres os dois pontos da sociedade (governo e população, mas a situação acabou por acalmar e resolver-se."
Monarquia ou ... República ?


      Antes da implantação da Primeira República Portuguesa o país encontrava-se numa grande instabilidade política. Vigorava o rotativismo partidário que consistia na alternância entre o Partido Regenerador e o Partido Progressista. A Monarquia revelava-se incapaz de resolver os principais problemas económicos, sociais e financeiros que atingiam o país, caindo no descrédito da população.

      Em 1876 é fundado o Partido Republicano Português (PRP) que se tornou numa grande oposição aos partidos monárquicos e que foi ganhando cada vez mais força devido à crescente adesão da população. A 31 de Janeiro de 1891 deu-se a primeira tentativa de derrube da Monarquia que acabou por fracassar. Em 1906 o Rei D.Carlos nomeia para chefe do governo João Franco, instaurando-se a ditadura Franquista. Dois anos depois o rei D.Carlos e o príncipe herdeiro D. Luís Filipe são assassinados. D. Manuel assume o trono sendo obrigado a governar num clima de grande contestação, que culmina na grande revolução, que viria a fica para a História.

      Na manhã de 5 de Outubro de 1910 Eusébio Leão, José Relvas e outros dirigentes Republicanos proclamam da varanda da Câmara Municipal de Lisboa a primeira República Portuguesa. Com esta revolução o Partido Republicano sobe ao poder constituindo um governo Provisório chefiado por Teófilo Braga. Em 1911 é elaborada a Constituição Política Portuguesa, que consagra a divisão tripartida dos poderes. Entre as medidas adoptadas pelo Partido Republicano destacam-se: a promulgação da lei de separação do Estado e da Igreja, deste modo o catolicismo deixa de ser a religião oficial do Estado Português, que se torna laico; é implementado o registo civil obrigatório; institui-se o direito à greve e aboliram-se todos os títulos nobiliárquicos e até ordens honoríficas. A participação de Portugal na Primeira Guerra Mundial contribuiu para aumentar os desequilíbrios económicos e sociais do país acentuando ainda mais a instabilidade política; a dívida pública disparou. Devido a todos estes problemas instala-se uma grande agitação social. Este conjunto de factores leva a que em 1917 Sidónio Pais destitua o Presidente da República e enverede pela ditadura. Sidónio Pais acaba por ser assassinado em Dezembro de 1918. Com o fim do Sidonismo o país encontrava-se num autêntico caos, o que conduziu a uma Guerra Civil em 1919.

     Perante estas fragilidades e contradições da República, os opositores puderam reorganizar-se e fortalecer-se e a 28 de Maio de 1926 a República caiu num golpe militar dirigido pelo general Gomes da Costa, que iniciou a sua marcha em Braga, e foi saudada vitoriosamente em Lisboa.
Fotografias - 1ª República
     
Auxiliados pelo grupo de Área de Projecto que têm como tema
"Os problema sociais em Imagem nas Três Repúblicas",
revelamos assim algumas fotos relativas ao período da 1ª República.


     Descrição de alguns cartoons

 Mostramos agora "a faceta" satírica dos cartoons na Primeira República, tema central do nosso trabalho. É necessário transmitir uma mensagem fundamental: o período da República não se limita a uma "produção literária", existe também um lado iconográfico/satírico, que complementado com uma explicação teórica se torna bastante apelativo de explorar.   

O Gulliver da imprensa
      O jornal é uma arma de combate, megafone que espalha a voz do dono à escala nacional.
     Em finais de 1800 foram apertadas as rédeas sobre a imprensa, proibindo-se o que os juízes consideravam ofensivo ou subversivo, mas os jornais (sobretudo os doutrinários) continuavam a publicar toda a espécie de rumores, insinuações e segredos e de alcova que sirvam a sua casa.
      Em Lisboa desenrola-se durante anos um braço de ferro entre jornalistas e o juiz de instrução criminal e chefe de polícia,  Francisco Veiga, que não hesita em suspender jornais.
      Franco obriga-o à demissão após “A Luta” revelar  D. Carlos na compra de prédios para albergar os régios amores clandestinos. É substituído por Trindade Coelho, Maçon que quase sempre iliba os acusados de abuso de liberdade de imprensa, sobretudo as pró- republicanas. No fim da década os periódicos tornaram-se um incontrolável instrumento antimonárquico.
      Nas páginas seguintes, as manchetes de alguns dos mais importantes jornais da época relativos aos incidentes registados no regresso de Franco do Porto, em Junho de 1907, ilustra uma pluralidade de imprensa e mostram a sua liberdade e linguagem.
      A Paródia prevê que em 1903 a imprensa, esta gigantesca máquina (Gulliver) exterminará os inimigos ao acordar. Ou seja, os monárquicos serão demolidos pelos jornais e a República avançará.



Shiu, não quero piu!
      Portugal é católico, impregnado pelo clericalismo. A Igreja Católica confunde-se com o próprio aparelho do Estado e mantém em todos os níveis uma omnipresença asfixiante.
       A intimidade da Igreja com o Estado é enorme, dando-lhe um estatuto de gigantesca repartição pública do divino. A Constituição estabelece que o Estado tem por religião oficial e única o catolicismo.
      Declararam a sua adesão expressa à fé católica, além da Carta Constitucional, os Códigos Civil, Pessoal e Administrativo, além de outras leis básicas. Do berço à cova, a vida do cidadão é controlada pela Igreja. Não há registo civil. É a Igreja que faz o rol dos nascimentos, dos matrimónios e dos óbitos.
      Os bispos, sustentados pelo Erário público têm por inferência assentes na Câmara dos Pares, dispondo de influência na política e nas leis.
      Bispos e padres são nomeados pelo Governo, passando a receber a partir de certa idade uma reforma oficial como qualquer funcionário público. Existe até no Governo o Ministério dos Negócios Eclesiásticos e Justiça. É no Estado que tem origem grande parte das rendas da Igreja.
     Com a implantação da República em 5 de Outubro de 1910, Afonso Costa foi chamado a integrar o Governo Provisório da República, na pasta da Justiça e Cultos, lugar que ocupou até à dissolução daquele Governo (para ter sido aprovada a nova Constituição a 4 de Setembro de 1911).
     Recebeu dos seus opositores, a alcunha de “mata – frades”, pela legislação laicista que mandou publicar – Lei da separação do Estado e da Igreja, que alude no cartoon.
    A Igreja deixa de poder receber recompensas ou dinheiro das pessoas, perde bens inobiliários e mobiliário, deixa de ser a única religião do Estado.
    Afonso Costa torna-se obsessão por todos, desde os embaixadores, que reconhecem nele estofo de estadista (o único capaz de pôr fim à monarquia-relata o embaixador inglês para Londres - mas que não passa “ de um tirano à latino-americana, sem qualquer ideia de conciliação ou de liberdade”) até aos humoristas, de que é o alvo preferido, passando pelos eclesiásticos de privilégios perdidos e pelos seus inúmeros adversários republicanos.
     É o que se vê no cartoon- Afonso Costa como um diabo que vem acabar com o reinado da Igreja, queimando-a na fogueira tal qual a inquisição, expiando os seus crimes de abuso das fiéis a quem explorou por séculos.
Afonso Costa diz-lhes: Schiu, não quero piu!
Ou seja, acatem a ordem da admistração civil republicana e mais nada…


O que é de César com o que é de Deus
      Estado e Igreja vivem em tal promiscuidade que, apesar do esmagador catolicismo dos portugueses, muitos se questionavam acerca desta relação. O anticlericalismo não deixa de alastrar.
      Portugal é católico, mas, mais do que isso, impregnado pelo clericalismo no mais fundo de cada um dos seus poros. A igreja católica confunde-se com o próprio aparelho de estado e mantém em todos os niveis uma omnipresença asfixiante.
     A constituição estabelece que o estado tem por religião oficial e única o catolicismo. Comete crime quem celebre um culto público não - católico, sendo também crime faltar ao respeito à Igreja Católica.
     Do berço à cova, a vida do cidadão é controlada pela Igreja Católica. Não há registo civil. É a Igreja que faz o rol dos nascimentos, dos matrimónios e dos óbitos. Bispos e padres são nomeados pelo governo chegando a ter uma influência na política e nas leis.
    São muitas as obrigações que a Igreja impõe aos seus fiéis. Ter fé deixou à muito de se traduzir na defesa e na prática dos valores cristãos, mas sim no cumprimento de múltiplos rituais, orações recitadas, devoções, cânticos e comunhões. Pentência e comunhão definem o bom católico.
   Implantada a 1º República , os portugueses deixam de ter obrigações para com a Igreja porque o catolicismo deixa de ser a religião oficial de Portugal , tornando-se um Estado laico.



A FORÇA DA RUA

      A imagem de marca da República é a agitação permanente encarada como normalidade quotidiana, como se os politícos não conhecessem outra fora de se bater pelo poder. Bombas, atentados, pancadarias, sabotagens, revoluções. É tempestuosa a rotina politica nacional dos anos 10.
      O escritor Augusto de Castro, ironiza na Ilustração Portuguesa a meio da década: «As revoluções em Portugal tornam-se periódicas e como tal, não há razão para que não entrem, como a chuva ou o bom tempo, as festas mudáveis e os dias de feriados, nas previsões dos meteriologistas e nos programas do Borda d’ Água.»
      A Lisboa das revoluções, à força da insistência, acaba por absorver a agitação no quotidiano.
      Raul Brandão descreve os sentimentos da cidade durante mais uma intentona (Janeiro de 1908): « Tiros lá para o rio. Os marinheiros revoltaram-se. Cerram-se os taipais a toda a pressa e às dez, onze horas, começam as descargas no silêncio da cidade mergulhada em trevas. De manhã é o canhão qu fala. A fuzilaria dura até à uma hora. Andam soldados, em bandos, armados pelas ruas quase desertas. Mas logo depois dos tiros, Lisboa, já habituada, sai para a rua. À noite enchem-se os animatógrafos e os teatros».
      Através destes comentários e do que este cartoon nos mostra concluimos que para os lisboetas já é normal toda esta confusão, todas esta revoluções, já vivem com tudo isto, na realidade é a tranquilidade que incomoda e não a agitação.


O voto livre / Parlamentarismo
       O voto livre feminino, que Carolina Ângelo põe na agenda com o seu gesto desafiador do poder político masculino, é ridicularizado pelos humoristas na imprensa. A possibilidade de as mulheres votarem, foi discutido em 1911 devido ao gesto de Carolina Ângelo perante os humoristas. A República proíbe o voto das mulheres, ainda por completar pelo sufrágio em quase todos os países. Em 28 de Maio realizaram-se as eleições para a Assembleia Nacional Constituinte. Valendo-se da omissão sobre o sexo do chefe da família, a médica e 1º cirurgiã portuguesa Carolina Beatriz Ângelo (1877-1911) reivindicou o seu direito de votar, invocando a sua qualidade de chefe de família ", pois era única e mãe de uma filha. A lei não previa que o chefe de família fosse entendida como uma mulher".
      O tribunal constitucional entendeu que a forma gramatical “ cidadãos portugueses” abrangia também as mulheres e deferiu a sua pretensão. Para evitar isso, a lei foi alterada no ano seguinte e especificação de que apenas os chefes de família do “ sexo masculino” poderiam votar. Este cartoon realça o facto, de as mulheres não poderem votar. O 2º cartoon reforça este, pois se as mulheres estivessem no parlamento dominariam o homem.
       O sistema político português assentava num rotativismo partidário, que consistia na alternância dos dois principais partidos monárquicos, o Regenerador (liderado por Augusto Hintze Ribeiro, que já havia chefiado o governo) e o Progressista (chefiado por José Luciano de Castro que já havia alternado com Hintze á frente do Ministério). Ruína, era a palavra que melhor classificava a imagem da classe política portuguesa, pois os constantes conflitos entre os membros dos partidos, as rivalidades inúteis que se sobrepunham aos interesses da vida nacional e a própria descrença no rotativismo em aliviar a situação débil do país foram os principais factores responsáveis pelo desabamento deste sistema político português.

Bibliografia:

• VIEIRA, Joaquim – Portugal Século XX, Crónica em Imagens 1900-1010. Edição nº 4085. Círculo de Leitores ISBN 972-42-1909-7

• VIEIRA, Joaquim – Portugal Século XX, Crónica em Imagens 1910-1020. Edição nº 4086. Círculo de Leitores ISBN 972-42-1986-0

• Couto; Rosas; Antónia – O Tempo da História – 3ª Parte, História A – 11ºano. 1º Edição. Porto Editora



Notícias da época 1910
Tendo como tema do nosso projecto "O Humor Satírico dos Cartoons na 1ª República Portuguesa", no primeiro período dirigimo-nos ao Arquivo Distrital de Braga. De maneira a obter um conhecimento mais aprofundado sobre este tema recolhemos as notícias e cartoons correspondentes a este período (1910-1926).

Entre os jornais consultados ("O Mundo" e o "Comércio do Minho") selecionámos as seguintes noticias e cartoons:
"O mundo" -  4º trimestre 1910  - 6 Outubro 1910
Pela república e pela pátria
      Cantemos! A nação portuguesa escreveu ontem uma página gloriosa na sua história. Libertou-se, emancipou-se! A monarquia era, pelas suas feições opressiva e desmoralizadora, uma vergonha para este belo e doce povo de Portugal! Anos e anos, combateu o povo para se governar por si. Combateu como generoso, quase como santo. Tentou persuadir, procurou convencer. Ao argumento respondeu a monarquia com a violência, a tradição. Não houve prova que a convencesse. O partido republicano fez uma revolução sem armas, como foi o das últimas eleições, e a monarquia insistia em governar contra ela. A revolução pelas armas foi-se tornando cada vez mais inevitável e imperiosa. Mas a nação republicana, ate nesse extremo, foi, como sempre, honrada. A monarquia, se tivesse forças para esmagar a revolução republicana seria cruel, como cruéis chegaram a ser algumas das suas forças. A revolução republicana foi generosa ate onde podia sê-lo. Se o matou, não foi por prazer. Foi por necessidade. Vitoriosa, a monarquia expandiria odiosos. Triunfante, a república limitou-se a expandir alegria.
      A república tem de seguir as tradições do Partido Republicano e a orientação que assinalou na hora do triunfo. A república não pode olhar descuidada para a sua defesa. Se houver loucos que sonhem em tentar contra a sua existência ou seja em contrariar a vontade nacional - a tentativa tem de ser repelida com pronta energia. A república tem de defender-se, e saber defender-se, para o bem do país que quer servir. Mas tem de impor-se, e a de inspirar-se nos princípios de ordem, liberdade e de tolerância que apostolizou. Nessa hora de ébria alegria, empanada apenas pela recordação dos mortos, sobretudo dos nossos mortos, os republicanos portugueses, essa grande massa que constitui o povo, a nação, tem que saber, como sempre, honrar os altos ideiais que lhe deram força moral e material para a formidável vitoria ontem levada a termo. Nem dormir o sono solto sobre os louros de glória, nem abusar dela para excessos. A república está feita em condições que nenhum facto, nenhuma forca pode abala-la. Quando um povo recebe uma forma de governo com o louco entusiasmo com que ontem foram acolhidas as novas instituições essa forma de governo consolidou-se imponderavelmente. Sem embargo, é necessário que nada ou ninguém impeça o seu regular funcionamento. E é necessário que todos demonstrem que a república é para os portugueses, antes de mais nada, uma forma de governo onde o povo tem a justa noção dos seus direitos e dos seus deveres.
      Cantemos! Cantemos a republica e com ella a liberdade e a justiça! Cantemos à nossa pátria, mão de exército e o povo que sabem danificá-la! Glorifiquemos essa rutilante aurora que surgiu para a vida portuguesa. Não há mais privilégios de raça que desohram os que os reconhecem. Não há mais actos de despotismo que deprimem. Não mais roubos envergonham. Não mais imoralidades que degradam. A nação da nação e para a nação, do povo e para o povo. A igualdade, a liberdade e a moralidade. O povo emancipado o povo soberano. Temos motivos para cantar. Temos o direito e o dever de faze-lo. De escravos convertemo-nos em homens. Deixamos de ser súbditos para ser cidadão. Levantamo-nos subimos, engrandecemos – nos. Soem, por isso, triunfais e festivos, os hinos que podem traduzir a nossa alegria. Erga-se bem alto e bem ardente o grito que traduz a vossa vitória.
- VIVA A REPUBLICA!
      MAS DEFENDAMOS E HONREMOS ESSA REPUBLICA. Não sejamos imprevidentes nem imprudentes. Não deixemos perder posições, mas mostremos, por todas as formas, que somos dignos deles. Assim poderemos gritar cada vez mais orgulho e mais desvanecimento: - VIVA A REPUBLICA! Assim edificaremos uma grande república digna dessa grande pátria VIVA A REPUBLICA! VIVA A PATRIA!


Terça-feira 12 de Julho de 1910  -  PORTUGAL LÀ FORA - Monarchia ou… republica

O que diz um jornalista francês:

       Portugal atravessa ao que parece uma crise muito grave, e devem passar se em Lisboa acontecimentos de uma grandeza capital.
       Que acontecimentos? Não é fácil sabe-lo, porque uma censura severa e hábil não deixa transpirar; os telegramas das agencias e dos jornais não reflectem nas entres linhas senão uma luz imprecisa.
       Falou-se da precisão de numerosas personalidades portuguesas comprometidas. Falou-se da abdicação do jovem rei Manuel a favor de Afonso de Bragança. Finalmente, a acreditar outra versão, a família real estaria preocupada com instantes necessidades de dinheiro.
        A juventude do soberano conciliou-lhe ao princípio a simpatia geral e a sua evidente boa vontade desarmou por um momento as reivindicações populares. Mas a opinião pública depressa revirou, e hoje a exasperação parece ser unânime contra uma dinastia que se afigura desacreditada de uma maneira definitiva.
        A causa desse reviramento filia-se simplesmente no enorme escândalo produzido pelo lerach do credito predial português. Abriu-se um inquérito jurídico, em virtude do qual os livros da contabilidade da companhia foram apreendidos e o seu funcionamento suspenso. Entre as pessoas comprometidas … deve-se destacar em primeira linha o próprio governador do credito predial, o senhor Luciano de Castro, que é o chefe do partido progressista, o protector e o tutor politico do jovem monarcha.
       Imagine-se que autoridade isto pode dar ao governo!
       Enquanto as câmaras estavam fechadas, pôde-se evitar o escândalo, mas ao reabrir-se a tempestade rebentou. …
       A crise iniciada toma pois proporções consideráveis. O partido Monarchico oposto ao senhor Castro serás assás forte, assás energético para salvar Manuel? …
       Proclamar-se-ha amanha a famosa republica portuguesa que á tanto tempo que se anuncia?
       Entretanto o partido republicano… acaba de fazer uma comunicação oficial á Presse Associée a fim de informar o estrangeiro «sobre a verdadeira situação de Portugal».
      Segundo esse documento … a situação de Portugal do ponto de vista politico constituiria uma excepção entre as mãos europeias, porque enquanto entre ellas o problema da forma de governo está, para assim dizer, afastado, em Portugal se encontra na ordem do dia e mais o estará em consequência dos últimos e graves acontecimentos que ali se estão desenrolando.
        Em Portugal afirma o documento referido, existe realmente uma crise monarchica … Ninguém ousará contestar que a Monarchia está abertamente em falência.
       O partido republicano inúmera também no seu manifesto as causas de crise Monarchica: a impopularidade da dinastia … , a sua indiferença em face dos interesses nacionais, a ameaça contra as garantias constitucionais, … um rei ignorante e inexperiente sofrendo a influencia de uma camarilha reaccionária e clerical etc, etc.
         Entretanto, Portugal num país com tantas condições naturais e de trabalho favoráveis com um povo tão fácil de governar…

E o manifesto do partido republicano conclue assim:
« a republica! Esta ex a única solução do problema politico português!...
Amanda pelo pais, a republica portuguesa gosará da simpatia de todas as potencias estrangeiras»


















Terça-feira, 5 de Abril de 1910 - Ano X




- Santo Padre, tenho roubado muitos milhões.
- Isso é mau, meu velho, muito mau. Irás para o Inferno.
-Mas eu dei alguns milhões à igreja.
-Bem; então…irás para o paraíso.
 De «L’Asino»

 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 



"O Mundo" 3º trimestre - Domingo, 10 de Julho de 1910
                                     Numero: 3481
                           Título: Táctica do “Mundo”

Os nossos processos sempre contra a monarchia-provas.
…. A nossa táctica é procurar conquistar liberdades mesmo dentro da monarquia? “ O Mundo” julga sentir a república pagmando pelos princípios liberais. “O Mundo” entende do seu dever fazer reclamações daquelle género, que estão a dentro da orientação do partido que desde annos reclama de lei eleitoral, e que, ainda recentemente resolveu empreender uma campanha contra o juízo de instrução criminal…
      Mas, reclamando actos liberais dos governos quando elles os prometem, não cuidamos apenas de provocar esses actos; Cuidamos também de os por à prova, cuidamos de ter argumentos, de ter factos, de ter autoridade para lhes gritar que são uns burlões.




Biografias de personalidades relevantes da época

quarta-feira, 17 de março de 2010

Manuel de Arriaga – O Idealista

      Manuel José de Arriaga Brum da Silveira, nasceu a 8 de Julho de 1840 nos Açores. Formou-se em direito na Universidade de Coimbra. Filiado no Partido Republicano Português foi eleito quatro vezes deputado pela Madeira. Em 1911 tomou posse do cargo do Presidente da República. Moderado e isento tenta fazer pontes com a Igreja e situar-se acima das lutas das fracções.
      O seu mandato foi muito agitado e cheio de dificuldades porque os diferentes partidos republicanos que então se formaram não se conseguiam entender. Além disso, instalou-se um clima de grande agitação social tendo havido também tentativas de reposição da Monarquia. Greves, tumúltos, insegurança levaram a sucessivas quedas do Governo.
      Morreu em Lisboa a 5 de Outubro de 1917.

José Relvas – O Erudito

      José Mascarenhas Relvas nasceu Golegã a 5 de Março de 1858. Formou-se em letras na Universidade de Coimbra. Violinista, amante das artes e um dos mais sofisticados intelectuais do regime, foi José Relvas que às 9 horas da manhã, depois da rendição dos Monárquicos, se debruçou na varanda dos Paços do Concelho para proclamar ao país a vitória da revolução e a implantação da República.
     No novo regime assumiu a pasta das finanças do Governo Provisório. Em 1919 assumiu o cargo de chefe do Governo para tentar recompor o país da grave crise pós – sidonista.
      Morreu a 31 de Outubro de 1929.

Bernardino Machado

      Bernardino Luís Machado Guimarães nasceu no Rio de Janeiro a 28 de Março de 1851. Estudou Filosofia e Matemática na Universidade de Coimbra onde se doutorou em 1876.
      Em 1882 filiou-se no partido Regenerador (monárquico). A sua carreira inicia-se como Ministro das Obras Públicas de Hintze Ribeiro, mas desiludido com a Monarquia, aderiu à maçonaria e ao Partido Republicano Português. Depois da revolução de 5 de Outubro de 1910, assumiu a pasta dos negócios estrangeiros do Governo Provisório.
      Em 1914 é eleito Primeiro – Ministro mas, apenas por alguns meses. A resignação dá-lhe a presidência em 1915. Em fins de 1917 é destituído por Sidónio Pais que o remete ao exílio.
      Em 1944 morre vítima de pneumonia aguda.

António José de Almeida – O Tribuno

      António José de Almeida nasceu em Vale da Vinha, Penacova, em 1866. Licenciou-se em Medicina na Universidade de Coimbra.

      O mais portentoso dos oradores republicanos, António José de Almeida, eleito deputado em 1906, troca a cátedra de Medicina pela política.
      Com  44 anos no 5 de Outubro torna-se acérrimo rival de Afonso Costa. Funda e dirige o jornal "República" e cria o Partido Evolucionista que apenas chefia durante um ano. Em 1919 é eleito Presidente da República.
      Faleceu em Lisboa a 31 de Outubro de 1929.

Afonso Costa – O Político

      Afonso Augusto de Costa, nasceu a 6 de Março de 1871 em Seia. Fez o curso secundário da Guarda e no Porto- Licenciou-se em Direito na Universidade de Coimbra em 1895. Advogado, deputado aos 19 anos (1900) Afonso Costa é um agitador, com discursos que impressionam mais pelas virulência (discurso um bocado doente para tentar convencer) do que pela solidez.
      Não chega a participar no 5 de Outubro. Ministro da Justiça logo a seguir, publica as leis que romperam com a Monarquia e o tornam no mais eminente republicano, tão amado como odiado.
      Primeiro-Ministro em 1913 extingue o défice crónico do orçamento, surpreendendo pela posse do Estado.
      Afonso Costa acaba por falecer em 1937.


Bibliografia:
www.centenariorepublica.pt/escolas/personalidades-republica/A
Vieira, Joaquim - Portugal século XX, Crónica em Imagens 1910-1920. Edição nº 4086. Círculo Leitores. ISBN 972-42-11980-0  
Página 49,50 e 51